Por Marcos Souza

Empresas investem milhões em tecnologia, mas, no fim das contas, muitos sistemas acabam sendo mais um problema do que uma solução. O motivo? A falta de um bom trabalho inicial na definição de requisitos. A pesquisa de Fernández e colaboradores atesta que quase metade dos problemas e dos fracassos nos projetos de software são devidos a falhas na comunicação e documentação [1]. O resultado é previsível: softwares caros, desalinhados com a realidade do negócio e um ciclo interminável de ajustes e retrabalho.

Agora, imagine se houvesse alguém que organizasse essas informações desde o início, conectando as áreas certas para evitar problemas? Alguém que soubesse organizar informações, conectar diferentes áreas e garantir que todo o processo corresse de forma eficiente? Esse papel pode ser desempenhado pelo Profissional de Secretariado Executivo (PSE).

A princípio, pode parecer uma conexão improvável, mas faz todo sentido. A Engenharia de Requisitos (ER) tem como objetivo identificar e documentar exatamente o que um sistema precisa antes mesmo de ser desenvolvido. O PSE, por outro lado, é um especialista em mediação, organização e gestão da informação. Juntos, eles podem formar uma parceria estratégica poderosa.

Mas o que, afinal, é Engenharia de Requisitos? Em termos simples, é o processo de entender, registrar e gerenciar tudo o que um sistema precisa para funcionar corretamente. Parece simples, mas não é. Muitas empresas não sabem exatamente o que querem – e os desenvolvedores, sem uma visão clara, acabam construindo soluções que não resolvem o problema real.

Se essa ponte entre necessidade e solução for mal construída, o software pode:
❌ Ser inútil para os usuários finais;
❌ Demandar correções e ajustes mais frequentes que o normal;
❌ Se tornar um pesadelo de custos e prazos fora de controle.

E é exatamente aqui que o PSE entra como um facilitador.

A Engenharia de Requisitos (ER) não acontece de uma vez só, ela segue um conjunto de etapas. E em cada uma delas, o PSE agregaria valor de forma estratégica para que as informações fluam, que as expectativas sejam alinhadas e que o projeto siga um caminho bem estruturado.

1. Elicitação de Requisitos: O Poder das Perguntas Certas

Um dos maiores desafios da ER é transformar ideias soltas em requisitos compreensíveis. Muitas vezes, o cliente sabe o que quer, mas não sabe expressar. O PSE, acostumado a lidar com diferentes públicos e interpretar expectativas, pode guiar entrevistas e reuniões para extrair informações realmente úteis.

🔹 Exemplo: Uma empresa quer um sistema para gerenciar projetos. O pedido inicial é: “Queremos algo simples, intuitivo e que atenda a todos os setores.” Isso é vago. O que significa “intuitivo”? Que setores exatamente precisam ser atendidos? Quais funções são indispensáveis? O PSE reformula a conversa para obter respostas mais específicas:
– O sistema precisa de diferentes níveis de permissão?
– Como as tarefas serão organizadas e distribuídas?
– Quais métricas são essenciais para relatórios de desempenho?

Fazer as perguntas certas evita suposições perigosas e torna a elicitação de requisitos muito mais efetiva. No fim das contas, um projeto bem-sucedido não nasce apenas de boas ideias, mas da capacidade de refiná-las e dar a elas uma estrutura funcional [2].

2. Análise de Requisitos: Separar o Essencial do Supérfulo

Nem toda demanda faz sentido. Algumas são inviáveis, outras simplesmente não são prioritárias. O PSE, com sua experiência em gestão de prioridades, pode ajudar a classificar os requisitos de forma objetiva.

🔹 Exemplo: Um hospital quer um sistema de agendamento de consultas.
– Essencial: Marcação e cancelamento online.
– Desejável: Integração com WhatsApp.
– Dispensável: Uma IA que diagnostica sintomas.

Ao filtrar o que realmente importa, evita-se desperdício de tempo e recursos com funções que, na prática, não serão utilizadas. A análise de requisitos não é só sobre o que pode ser feito, mas sobre o que deve ser feito para garantir um sistema funcional [3].

3. Especificação de Requisitos: Transformar Ideias em Documentação

Requisitos bem definidos precisam ser registrados de forma bem descrita e como o nome já diz, especificada. Aqui, a habilidade do PSE em organização e redação empresarial faz toda a diferença.

🔹 Exemplo: Um software de folha de pagamento precisa lidar com regras salariais complexas. A documentação precisa deixar claro:
– Como serão calculadas horas extras e benefícios?
– Quais integrações são necessárias com bancos e órgãos reguladores?
– Como será a gestão de acessos para evitar vazamento de dados?

A falta de especificação pode levar a interpretações erradas e a sistemas que não atendem às reais necessidades do negócio.  A documentação bem feita não é só um detalhe, é a principal ferramenta que propicia que o software seja construído corretamente [4].

4. Validação de Requisitos: Testar Antes de Construir

Depois que os requisitos são levantados e documentados, é preciso validar se fazem sentido na prática. O PSE, além de organizar reuniões, pode ajudar a testar fluxos de trabalho e coletar feedback dos usuários antes que a equipe de desenvolvimento inicie a codificação.

🔹Exemplo: Um sistema de reembolso de despesas está prestes a ser implementado. Antes de dar continuidade, o PSE verificaria:
– O fluxo de aprovação reflete a burocracia real da empresa?
– Existe alguma funcionalidade que possa ser simplificada?
– Os usuários finais conseguem navegar no sistema sem dificuldades?

Essa etapa evita dores de cabeça futuras e reduz a necessidade de ajustes no meio do caminho [5].

5. Gestão de Requisitos: Manter Tudo Sob Controle

Sistemas evoluem. Novas demandas surgem. O que era essencial hoje pode ser dispensável amanhã. A gestão de requisitos é sobre acompanhamento contínuo. Quando qualquer mudança ocorrer, então o PSE a documenta e a integra ao projeto sem comprometer prazos ou orçamento [6].

🔹Exemplo: Durante o desenvolvimento de um sistema de RH, a empresa decide incluir assinatura digital nos contratos. O PSE documenta a nova exigência, verifica impactos e assegura que a alteração seja feita de forma organizada.

Para otimizar seu trabalho na ER usando ferramentas que ajudam na coleta, organização e gestão de requisitos:

✅ Para coleta e organização: Miro, Notion e Trello;
✅ Para documentação: Confluence, Google Docs e ClickUp;
✅ Para prototipação e validação: Figma e Miro;
✅ Para gestão de requisitos: Jira, Trello e Azure DevOps.

O domínio dessas ferramentas amplia a capacidade do PSE de atuar de forma estruturada, ágil e realista.

A falha na definição de requisitos é uma das principais causas de problemas em projetos de software. Muitas empresas enfrentam atrasos, custos elevados e sistemas falhos porque a comunicação entre negócios e tecnologia sofre ruídos [3].

O Profissional de Secretariado Executivo, com sua expertise em comunicação, organização e negociação, pode ser o elo que falta para tornar a Engenharia de Requisitos mais robusta.

No cenário digital atual, o PSE tem a chance de se posicionar além do suporte administrativo: como um profissional-chave na conexão entre tecnologia e negócios e ajudar a transformar necessidades abstratas em soluções concretas. E num mundo cada vez mais computacional, essa habilidade não é apenas valiosa, é indispensável.

REFERÊNCIAS

[1] FERNÁNDEZ, D.; WAGNER, S.; KALINOWSKI, M., et al. Naming the pain in requirements
engineering: contemporary problems, causes, and effects in practice. Empirical Software
Engineering
, v. 22, p. 2298-2338, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.48550/arXiv.1611.10288.

[2]  SOMMERVILLE, I. Software engineering. 9th ed. Boston: Pearson, 2011.

[3]  WIEGERS, K.; BEATTY, J. Software requirements. 3rd edition. Redmond, Washington: Microsoft Press, 2013.

[4] PRESSMAN, R. Software engineering: a practitioner’s approach. Palgrave macmillan, 2005.

[5] KOTONYA, G.; SOMMERVILLE, I. Requirements engineering: processes and techniques. Wiley Publishing, 1998.

[6] LEFFINGWELL, Dean. Agile software requirements: lean requirements practices for teams, programs, and the enterprise. Addison-Wesley Professional, 2010.

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